COLUNISTA CONVIDADOEspaço para intelectuais que contribuem para o fortalecimento do humanismo no Brasil e no mundo.
POR AGASSIZ ALMEIDA
Foi constituinte em 88 e um dos principais artífices do fortalecimento do Ministério Público na Constituição. Recebeu a máxima comenda da Associação Nacional do Ministério Público pelos relevantes serviços prestados ao MP. É escritor e ativista dos direitos humanos.
Quando as botas dos tiranos esmagarem as liberdades.
Quando cessar o último grito de indignação.
Quando não se ouvir mais o eco de uma palavra livre.
Quando o verdugo do cárcere negar olhar o amanhecer.
Quando só se ouvir apenas o toque de cornetas.
Quando a noite se eternizar na mente dos condenados.
Não desistirei!
Quando o tiranete rir do olhar materno.
Quando todos os caminhos levarem ao imponderável.
Quando arrancarem das mentes a razão do existir.
Quando se fizer da tortura a glorificação.
Quando subtraírem das consciências a capacidade de discernir.
Quando o poder da mediocridade sobrepujar a inteligência.
Não desistirei!
Quando o ódio fanático vencer a razão.
Quando o tiranete esfarrapar a liberdade.
Quando os sabugos morais se agruparem em hordas milicianas.
Quando as baionetas determinarem a lei.
Quando os gritos do torturado se perderem na noite dos tempos.
Quando cessar a inteligência e a estupidez se agigantar.
Não desistirei!
Quando a farsa vencer a justiça.
Quando se idolatrar a mediocridade e se negar o pensar.
Quando tudo parecer perdido.
Quando o oceano se fizer túmulo dos desaparecidos pelas tiranias.
Quando o verdor da floresta se tingir do sangue dos desaparecidos pelas ditaduras, e se ouvir o último soluço de uma mãe.
Quando a tirania tombar e a História abraçar os heróis.
Não desistirei!
Post scriptum. Com esta ode patenteio homenagear todos aqueles que, no ontem e no hoje da história, resistiram ao furor dos tiranos e dos seus sequazes.
Nesta hora em que a mediocridade agressiva comanda o país, dedico este hino a todos os resistentes nestes tempos contemporâneos, e, entre eles, lá estão Edval Cajá e Fernando Santa Cruz, in memoriam.
Sem os tantos bravos que engrandecem o panteão da história, a humanidade seria um rebanho debaixo do chicote dos tiranos. Só certos tipos com alma de escravo negam a liberdade.
Imagem: Eugène Delacroix